domingo, 26 de março de 2017

Catarina van Hemessen (1528- >1587) parte II




Com 26 anos Catarina casou com Kerstiaen de Moryn. Músico excelente, veio a tornar-se no organista da Igreja de Nossa Senhora de Antuérpia. E como tal organista da corte da rainha Maria de Hungria, princesa da dinastia do Habsburgos, irmã do imperador Carlos V, infanta de Espanha.

 Depois do casamento assina e data apenas um quadro "A flagelação de Cristo" de 1555.

Os quadros de temas religiosos de Catarina van Hemessen terão tido menos sucesso que os seus retratos.

Entretanto, a rainha viúva Maria de Hungria retira-se para Madrid em 1556 levando consigo como membros da sua corte o jovem casal. 

Não há evidência documentada do que  Catarina terá feito nessa sua estadia em Espanha. Professora de arte de damas de corte, de aias da rainha ou aia ela própria? Não se sabe.

 Dois anos depois Maria de Hungria morre e terá deixado ao casal uma pensão vitalícia. Catarina e seu marido regressam a Antuérpia e em 1561 De Moryn aceita a posição de organista na Ilustre Irmandade de Nossa Senhora em Hertogenbosch. Sem filhos que lhes perpetuassem o nome desaparecem, em termos de documentos, em 1565.

No entanto em 1567 Ludovico Guicciardini refere-se a Catarina como ainda viva. Este Ludovico é sobrinho do notável homem de estado, diplomata e historiador Francesco Guicciardini.
Vasari também se lhe refere no "Vidas" em 1568.

Fica uma vida curta de artista que não terá durado em termos de actividade muito para além do casamento.













Ficam os seus retratos realistas, muito realistas, com poucas cedências em termos de embelezamento dos modelos. Fundos neutros, rostos sérios, fatos escuros, ambiente intimista, pequenas dimensões.






Ficam os seu autoretratos o primeiro em que a jovem artista de 20 anos se retrata orgulhosamente a pintar e este, possivel, autoretrato de uma Catarina com mais idade e vida.


domingo, 5 de março de 2017

Catarina van Hemessen(1528- após1587) parte I




"EGO CATERINA DE/ HEMESSEN ME/ PINXI/ 1548" 
Eu, Catarina de Hemessen  me pintei

Este é o autoretrato de Catarina de Hemessen e a mais conhecida das 13 obras que por si ficaram assinadas.
                         Tinha 20 anos. Vivia em Antuérpia, e era filha de Jan Sanders Hemessen.

 Jan Sanders Hemessen, seu pai,  era um muito bem sucedido pintor e comerciante de arte (em actividade desde 1519 a 1556).

Antuérpia era, ao tempo, o centro do comércio da Europa do Norte, com muito dinheiro e recursos.
Os conhecimentos sociais de Jan de Hemessen que  passavam do burgomestre à corte, eram indicadores que se movia bem em meios com influência.

 Tal como para outras mulheres pintoras deste século XVI nascer em meio artístico constituía uma mais valia considerável. Era possível treinar, sem desonra, no atelier da família.

Catarina pertencia a uma família culta e aberta ao mundo das artes. 3 dos seus irmãos também aprenderam pintura e uma irmã seria excelente música.

Neste seu autoretrato Catarina mostra-se ao cavalete, com aspecto sereno, sóbriamente vestida, poucos adornos e muito séria a pintar, realmente a pintar, realmente a pintar-se

Como se fora este o seu cartão de visita: mulher pintora, que pinta e sabe pintar. Mulher com educação que usa  a língua franca e culta da altura - o latim e que pinta como modo de vida.

E esta maneira de se apresentar é uma novidade em relação aos outros artistas seus contemporâneos.

  
Marcia  deMullierbus Claris Bocaccio século Xv
Será que foi buscar o modelo a Marcia, filha de Varros, pintora da Roma Antiga e assim mostrada no De Mullierbus Claris, de Bocaccio escrito cerca de 1360/70)?
 Ou a Tamaris pintora grega também referida por Bocaccio? 


Não sabemos. Mas fica este ar de pintora séria e comprometida com a sua arte.

Tamaris e Diana,De Cleres et Nobles Femmes, Franca, sec.Xv

Incunábulo germânico, Heinrich Steinhöwel trad.  Boccaccio’s De Mulieribus Claris, c1474 

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Properzia de Rossi, A única mulher escultora do Renascimento( 1490- 1530)

Properzia da Rossi foi a única mulher escultora do Renascimento. Com talento e tenacidade excepcionais.

Dela e da sua vida breve pouco se sabe.


ouro, esmalte, caroço de pêssego
Terá nascido cerca de 1490, filha de um notário, em Bolonha, abastado o suficiente para dar alguma educação à sua filha.

Teve lições de desenho com Marcantonio Raimondi, artista, hoje conhecido pelas reproduções em gravura de Rafael.



Mas o traço no papel transformou-se  e ganhou forma tridimensional em trabalhos delicados de minuciosas miniaturas esculpidas em caroços de fruta, como de alperces e pêssegos. Essas pequenas obras de arte eram habitualmente de cariz religioso e bastante apreciadas por nobres e pessoas de bem.

No Museu Cívico de Bolonha estão expostos 11 desses trabalhos encrustados numa filigrana de prata. De um lado vêmos os  12 apóstolos, do outro as santas virgens.

pormenor do Brasão da família Grassi


Talento excepcional que fez com que Vasari a incluisse nas " Vidas". Miraculosa, excelente artista de música e dona de casa assim era descrita Properza.



brazão da família Grassi em filigrana de prata













Construção da Arca de Noé



a anunciação
Talento excepcional que a faz abalançar-se ao mármore em obras de grande porte por volta dos seus 30 anos, como em vários bustos e no altar mor de  Santa Maria del Baraccano.

Tento imaginar o olhar dos outros escultores da época e uma mulher teimosa e cheia de pó a desbravar mármore e a dele arrancar as formas seguras .


José e a Mulher de Potifar
Talento exepcional que fez com que ganhasse, também por volta dos 30 anos, a comissão para as esculturas da fachada oeste da Igreja de S. Petrónio em Bolonha. Ultrapassando os seus competidores, claro está, masculinos.

Ficaram os registos de pagamentos para 3 sibilas, 2 anjos, 2 painéis em baixo relevo incluindo o de "José e a mulher de Potifar".

Ficaram os rumores de um amor por um nobre que a malestimou e trocou por outra melhor nascida.


Hércules derrotando as amazonas
Ficaram ainda registos de um certo mau feitio por conduta desordeira em 1520 e novamente em 1525 por ter atirado tinta à cara de um artista.


perfil em bronze, artista desconhecido
E o último registo é o da sua morte. Cerca dos 40 anos.

 Morre sózinha e pobre num Asilo de indigentes na sua cidade natal em 1530.







Sem mágoas fica

 a sua escultura sofisticada, vigorosa e clássica.
































quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Elisabetta Sirani(1638-1665) : uma escola e a morte

Prova de independência e de um modo diferente de pensar trabalha num estúdio próprio, tendo, no entanto, o pai como seu agente inexorável e devotado.

Mantinha-se a pintar com entusiamo e um frenesim total. Arranjava ainda tempo para receber no seu estúdio hóspedes ilustres, nobres com quem partilhava entretenimento e música.
Redentor benedicente, 1664. Bologna, Pinacoteca Nazionale,

A sua fama era tal que de vários pontos da Europa a vinham ver trabalhar. Mas ainda mais interessante é o facto de outras meninas quererem ter aulas com ela, a quem considerariam um exemplo a seguir e a emular. Elisabetta Sirani cria assim a primeira escola de pintura para Meninas. Única no seu género e também a primeira. As suas irmãs Anna Maria e Bárbara foram assim suas alunas.

O trabalho incansável conduz, provávelmente, ao agravamento do seu estado de saúde.

Morre de uma perfuração de úlcera gástrica aos 27 anos de idade entre dores indizíveis.
Suspeitas de envenenamento recaem sobre a criada da família que é sujeita a um longo processo crime e posterior  afastamento de Bolonha e nunca toalmente ilibada.

Embora  as provas não tenham apontado em tal sentido, quer da parte do pai quer de amigos, como Malvasia, a versão da morte prematura de Elisabetta que fica para a história é a versão do envenenamento que, poderemos considerar mais romântica e trágica que uma (terrível) perfuração de úlcera.



Menino Jesús sobre o globo terrestre, 1658

S. Jerónimo

Santo António de Pádua, 1660
San Jerónimo, 1660

San Bruno, 1657
 

Dallila; 1664, colecção particular( e a minha pintura favorita)


Pintora de génio, trabalhadora incansável e de técnica exímia, em 10 anos deixou-nos cerca de duzentas obras ( devidamente auto assinaladas em "Nota delle pitture fatte da me Elisabetta Sirani").
Essas, sim, testemunho da estrela fulgurante que foi Elisabetta Sirani.

Elisabetta Sirani(1638-1665): Falam as obras

Trabalhava febrilmente dedicando-se de corpo e alma à sua Arte.

Que "falem"  os seus trabalhos.



estudo para a Virgem e o Menino


A Virgem e o Menino


Vejamos as suas "Madonnas com o Menino", com um ar de ternura, quotidiano e acessível, mas de um incontornável encanto e cumplicidade entre a Mãe e o Menino, e até a luz (símbolo para o divino Espírito Santo) espreita as cenas e invade a casa, em raios ténues. No espectro oposto Maria chorando a perda do Filho.
Mater Dolorosa, 1660


E as heroínas? Tão interessante que as mulheres como produtoras de Arte, e em todos os tempos, gostem de representar os seus arquétipos e referentes femininos de coragem e virtudes.


Santa Maria Madalena que reza e medita, a mais querida e próxima discípula de Jesus. As Sibilas, da antiga mitologia greco-romana, mulheres poderosas de inspiração profética, sob o poder de Apolo, deus da Luz e do Sol.

M.Madalena em prece, 1660
assinatura da pintora em "As Sibilas"
 


As Sibilas, 1660
 

       
M.Madalena, 1660
Vejamos em seguida heroínas biblícas, a nossa conhecida Judite (e Holofernes), Pórcia, onde a personagem é abordada de um modo diferente do habitual. Não é a mulher  ferida e lacrimosa para tentar impedir as intenções do marido( Bruto) de assassinar César, é mostrada uma mulher determinada no momento consciente de se ferir.
Judite e Holofernes
Porcia. Bologna, Collezioni d'Arte e di Storia della Fondazione Cassa di Risparmio em Bologna.

 


Elisabetta Sirani (1638-1665) e os retratos

Com a técnica cada vez mais apurada dedica-se a representar-se a si mesma ou a outras mulheres, heroínas biblicas ou grandes damas representadas em jeito de santas como era então a moda.

Aqui vem uma Dalila, pintada já na sua maturidade, de ar entre o divertido e o triunfante com a subreptícia tesoura na mão e uma madeixa do cabelo de Sansão.

Dalila, 1664, encomendado por Andrea de Buoi




A mosca

1665 Anna Maria Ranuzzi Marsigli como Caridade

retrato de Beatrice Cenci 1662, galeria nacional de arte antigaRoma

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Elisabetta Sirani (1638-1665) A pintora mágica

Em 1635 nasce na buliçosa Bolonha uma menina que vai dar que falar no mundo da Arte.

Bolonha era a segunda cidade do pontificado papal, com uma antiga e reconhecida universidade e uma cultura viva se bem que em plena Contra Reforma.



De Givanni Andrea com a ajuda de sua fiha Elisabetta





Esta menina era filha de Giovanni Andrea, também ele pintor e comerciante de arte e
representante de  outros pintores, nomeadamente de Guido Reni.

Elisabetta cedo começa a revelar um dom extraordinário para a pintura. Aos 17 anos já  recebe  comissões e cria várias miniaturas para a devoção privada.


Da sua técnica sabe-se  que da ideia  ao esquiço veloz, passava aos estudos em aguarela e à execução a óleo chegando à obra completa. Mas rápida e bem, com prodigiosa perfeição nos detalhes, delicada escolha das cores e praticamente sem correcções.


autoretrato como santa 1658
A sua fama, quase mágica, de rapidez e perfeição era tal que chegavam a vir pessoas de longe para a verem trabalhar e observar se tal era realmente possível.
Aos 20 anos em 1658 e depois de já ter pintado vários temas para as igrejas locais recebe a primeira grande comissão, de Daniele Granchio, prior do mosteiro de S. Girolamo( S. Jerónimo) de  la Certosa: um Baptismo de Cristo.


autoretrato em giz circa 1660









Esta peça faz parte de um vasto projecto cristológico onde entraram vários e consagrados pintores da sua época como Francesco Gessi, Giovanni Andrea Sirani (seu pai), Lorenzo Pasinelli, Domenico MariaCanuti e Giovanni Maria Galli Bibienae e uma única e jovem mulher: Elisabetta Sirani.

Começa afanosamente os estudos preliminares para a obra que lhe abre, aos 20 anos, as portas do reconhecimento.



estudo para o Baptismo

 

O baptismo de Cristo 1658
 
Embora a temática fosse predominantemente religiosa,  Elisabetta Sirani pintou retratos, temas mitológicos, autoretratos numa obra vasta (e assinada) que continuaremos a descobrir nos próximos "posts"

Catarina van Hemessen (1528- >1587) parte II

Com 26 anos Catarina casou com Kerstiaen de Moryn. Músico excelente, veio a tornar-se no organista da Igreja de Nossa Senhora de Antu...