quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Elisabetta Sirani(1638-1665) : uma escola e a morte

Prova de independência e de um modo diferente de pensar trabalha num estúdio próprio, tendo, no entanto, o pai como seu agente inexorável e devotado.

Mantinha-se a pintar com entusiamo e um frenesim total. Arranjava ainda tempo para receber no seu estúdio hóspedes ilustres, nobres com quem partilhava entretenimento e música.
Redentor benedicente, 1664. Bologna, Pinacoteca Nazionale,

A sua fama era tal que de vários pontos da Europa a vinham ver trabalhar. Mas ainda mais interessante é o facto de outras meninas quererem ter aulas com ela, a quem considerariam um exemplo a seguir e a emular. Elisabetta Sirani cria assim a primeira escola de pintura para Meninas. Única no seu género e também a primeira. As suas irmãs Anna Maria e Bárbara foram assim suas alunas.

O trabalho incansável conduz, provávelmente, ao agravamento do seu estado de saúde.

Morre de uma perfuração de úlcera gástrica aos 27 anos de idade entre dores indizíveis.
Suspeitas de envenenamento recaem sobre a criada da família que é sujeita a um longo processo crime e posterior  afastamento de Bolonha e nunca toalmente ilibada.

Embora  as provas não tenham apontado em tal sentido, quer da parte do pai quer de amigos, como Malvasia, a versão da morte prematura de Elisabetta que fica para a história é a versão do envenenamento que, poderemos considerar mais romântica e trágica que uma (terrível) perfuração de úlcera.



Menino Jesús sobre o globo terrestre, 1658

S. Jerónimo

Santo António de Pádua, 1660
San Jerónimo, 1660

San Bruno, 1657
 

Dallila; 1664, colecção particular( e a minha pintura favorita)


Pintora de génio, trabalhadora incansável e de técnica exímia, em 10 anos deixou-nos cerca de duzentas obras ( devidamente auto assinaladas em "Nota delle pitture fatte da me Elisabetta Sirani").
Essas, sim, testemunho da estrela fulgurante que foi Elisabetta Sirani.

Elisabetta Sirani(1638-1665): Falam as obras

Trabalhava febrilmente dedicando-se de corpo e alma à sua Arte.

Que "falem"  os seus trabalhos.



estudo para a Virgem e o Menino


A Virgem e o Menino


Vejamos as suas "Madonnas com o Menino", com um ar de ternura, quotidiano e acessível, mas de um incontornável encanto e cumplicidade entre a Mãe e o Menino, e até a luz (símbolo para o divino Espírito Santo) espreita as cenas e invade a casa, em raios ténues. No espectro oposto Maria chorando a perda do Filho.
Mater Dolorosa, 1660


E as heroínas? Tão interessante que as mulheres como produtoras de Arte, e em todos os tempos, gostem de representar os seus arquétipos e referentes femininos de coragem e virtudes.


Santa Maria Madalena que reza e medita, a mais querida e próxima discípula de Jesus. As Sibilas, da antiga mitologia greco-romana, mulheres poderosas de inspiração profética, sob o poder de Apolo, deus da Luz e do Sol.

M.Madalena em prece, 1660
assinatura da pintora em "As Sibilas"
 


As Sibilas, 1660
 

       
M.Madalena, 1660
Vejamos em seguida heroínas biblícas, a nossa conhecida Judite (e Holofernes), Pórcia, onde a personagem é abordada de um modo diferente do habitual. Não é a mulher  ferida e lacrimosa para tentar impedir as intenções do marido( Bruto) de assassinar César, é mostrada uma mulher determinada no momento consciente de se ferir.
Judite e Holofernes
Porcia. Bologna, Collezioni d'Arte e di Storia della Fondazione Cassa di Risparmio em Bologna.

 


Elisabetta Sirani (1638-1665) e os retratos

Com a técnica cada vez mais apurada dedica-se a representar-se a si mesma ou a outras mulheres, heroínas biblicas ou grandes damas representadas em jeito de santas como era então a moda.

Aqui vem uma Dalila, pintada já na sua maturidade, de ar entre o divertido e o triunfante com a subreptícia tesoura na mão e uma madeixa do cabelo de Sansão.

Dalila, 1664, encomendado por Andrea de Buoi




A mosca

1665 Anna Maria Ranuzzi Marsigli como Caridade

retrato de Beatrice Cenci 1662, galeria nacional de arte antigaRoma

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Elisabetta Sirani (1638-1665) A pintora mágica

Em 1635 nasce na buliçosa Bolonha uma menina que vai dar que falar no mundo da Arte.

Bolonha era a segunda cidade do pontificado papal, com uma antiga e reconhecida universidade e uma cultura viva se bem que em plena Contra Reforma.



De Givanni Andrea com a ajuda de sua fiha Elisabetta





Esta menina era filha de Giovanni Andrea, também ele pintor e comerciante de arte e
representante de  outros pintores, nomeadamente de Guido Reni.

Elisabetta cedo começa a revelar um dom extraordinário para a pintura. Aos 17 anos já  recebe  comissões e cria várias miniaturas para a devoção privada.


Da sua técnica sabe-se  que da ideia  ao esquiço veloz, passava aos estudos em aguarela e à execução a óleo chegando à obra completa. Mas rápida e bem, com prodigiosa perfeição nos detalhes, delicada escolha das cores e praticamente sem correcções.


autoretrato como santa 1658
A sua fama, quase mágica, de rapidez e perfeição era tal que chegavam a vir pessoas de longe para a verem trabalhar e observar se tal era realmente possível.
Aos 20 anos em 1658 e depois de já ter pintado vários temas para as igrejas locais recebe a primeira grande comissão, de Daniele Granchio, prior do mosteiro de S. Girolamo( S. Jerónimo) de  la Certosa: um Baptismo de Cristo.


autoretrato em giz circa 1660









Esta peça faz parte de um vasto projecto cristológico onde entraram vários e consagrados pintores da sua época como Francesco Gessi, Giovanni Andrea Sirani (seu pai), Lorenzo Pasinelli, Domenico MariaCanuti e Giovanni Maria Galli Bibienae e uma única e jovem mulher: Elisabetta Sirani.

Começa afanosamente os estudos preliminares para a obra que lhe abre, aos 20 anos, as portas do reconhecimento.



estudo para o Baptismo

 

O baptismo de Cristo 1658
 
Embora a temática fosse predominantemente religiosa,  Elisabetta Sirani pintou retratos, temas mitológicos, autoretratos numa obra vasta (e assinada) que continuaremos a descobrir nos próximos "posts"

sexta-feira, 17 de maio de 2013

La Tintoretta; Marietta Robusti (circa1560-1590)

Tintoretto auto retrato
Uma menina pequena vestida de rapaz acompanha o pai na oficina de pintura. O pai era Jacopi Robusti(1518-1594) o famoso Tintoretto( o "tintureiro"; alcunha que lhe vinha do mester do seu pai). A menina, Marietta Robusti ou La Tintoretta,  era a sua primogénita (fora do casamento). Dos sete futuros irmãos a mais querida e aquela que mais se assemelhava ao pai.

Marietta Robusti nasceu en Veneza em data que se desconhece algures entre 1554 a 1560.Com o pai aprende os rudimentos da arte, dele herda e desenvolve o traço cheio, o estilo chamativo e a paixão de pintar.

Porque o jeito para além de se herdar também se trabalha, desde cedo e tendo como mestre o seu pai, a sua pintura, principalmente na área do retrato aristocrático começou a ser apreciada na sociedade veneziana.

Não se lhe conhecem grandes encomendas para altares ou outras obras de monta. Se formos a ver de toda a sua pintura pouco se lhe reconhece realmente como seu, sendo de pensar que trabalharia em conjunto e em consonância com seu pai. O espólio de Marietta ter-se-á diluido no maior e mais conhecido corpo de trabalho de Jacopo. Mas o estilo e génios semelhantes induzem grande dificuldade nos eruditos em separar as obras acertadamente.

Marietta era também conhecida pelos seus dotes musicais e de canto. Numa das poucas obras que se lhe atribuem, sem dúvidas, o seu autoretrato, mostra-se junto a um pianoforte perfeitamente detalhado.


Pai e filha mantiveram-se fortemente unidos toda a curta vida de Marietta. Os convites de Filipe II e os de Maximiliano II, imperador do sacro Império Romano, para Marietta ir trabalhar em suas cortes, foram habilmente recusados pelo pai que não pretendia separar-se da sua filha. Até mesmo a condição para o seu casamento seria o de ficar a habitar na casa paterna até à morte deste.

Octavio Strada 1567/8
E foi isso que aconteceu ao casar em 1578 com o abastado joalheiro veneziano Mario Augusti.  Perde o seu primeiro filho Giacometti aos 11 meses de idade, e terá morrido, talvez, de parto, com 30 anos, malogradamente antes do pai.

É enterrada no jazigo da familia rodeada dos quadros do pai e muito provavelmente dela. Tintoretto, diz-se, que  breve, morreu de desgosto ao perder a sua filha muito amada, aquela que era realmente a herdeira e continuadora da sua arte, a pessoa com quem partilhava gosto e mestria. Jaz enterrado ao lado de Marietta na igreja de Madonna dell'Orto em Veneza.

 Contemporânea da nossa já conhecida Sofonisba Anguissola( 1532 - 1625) teve uma vida mais pequena e mais recatada talvez condicionada pelo pai e costumes da época, não muito abertos no que a escolhas femininas dizia respeito. Talvez por sua vontade.

Como seus quadros  figuram então: na galeria Uffizi: "retrato de senhora" e o seu autoretrato. "retrato de velho com rapaz"  ( 1585, Kunsthistorisches Museum) este último
tantos anos atribuído a Tintoretto pensa-se que realmente seja de Marietta dado o "M" tímido que aparece na assinatura.
retrato de senhora; museu do Prado( autoretrato em jovem?)


Curta a vida, excelente a arte.


Antoine-Joseph Dézallier d'Argenville, Abrégé de la vie des plus fameux peintres, A Paris, Chez De Bure l'Aîné, Quay des Augustins, du côté du Pont Saint Michel, à Saint Paul, 1745.

domingo, 24 de março de 2013

Giovanna Garzoni (1600-1670) Outra menina prodígio

O homem de artemino, 1648


Menina prodígio, tal como a já nossa conhecida Fide Galicia (1578-1630), Giovanna Garzoni nasce, talvez em 1600, em Ascoli-Piceno, perto da costa adriática em Itália.

Pouco se sabe dos seus inícios ou de quem a poderá ter ensinado. Terá, muito jovem, começado o seu trabalho como miniaturista de retrato, dedicando-se posteriormente à natureza morta.

cadelinha

Como outros pintores percorreu várias cidades em busca de trabalho e patronos. Na década de 1620 andava por Roma. Esteve 5 anos em Turim onde foi protegida dos duques de Sabóia.

Sustentava-se a si mesma e nunca casou.







Victorio Emanuel, duque de Sabóia, 1635, miniatura
Cristina de França, duquesa de Sabóia, 1635, miniatura





Carlos Emanuel I, duque de Sabóia, 1632-35













Em Florença continuou a sua arte tendo como patronos a corte dos Medici.







Figos




Voltou a Roma em 1651onde se manteve com trabalho constante e de sucesso até à sua morte em 1670.
Prato com ervilhas






Foi exímia pintora com um traço limpo e seguro. Basta ver as suas têmperas com pincel em velum (o seu meio favorito).







Têmpera com traço de pincel em velum



Era uma mulher do seu tempo, que aproveitou a ênfase humanística da observação directa e os surgimentos das várias taxonomias e classificações. Assim uma natureza morta, mais de que um género menor, configurava um trabalho quase científico de observação. O que explica também parte da excelente aceitação do trabalho de Giovanna Garzoni.

Têmpera com traço de pincel em velum


Parte da sua obra foi deixada a Accademia di San Luca, (dos pintores de Roma), atestando o reconhecimento que sempre obteve em vida.

Autoretrato 1650




Catarina van Hemessen (1528- >1587) parte II

Com 26 anos Catarina casou com Kerstiaen de Moryn. Músico excelente, veio a tornar-se no organista da Igreja de Nossa Senhora de Antu...